Transtorno Específico da Aprendizagem

Critérios Diagnósticos

A. Dificuldades na aprendizagem e no uso de habilidades acadêmicas, conforme indicado pela presença de ao menos um dos sintomas a seguir que tenha persistido por pelo menos 6 meses, apesar da provisão de intervenções dirigidas a essas dificuldades:

  1. Leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço (p. ex., lê palavras isoladas em voz alta, de forma incorreta ou lenta e hesitante, frequentemente adivinha palavras, tem dificuldade de soletrá-las).
  2. Dificuldade para compreender o sentido do que é lido (p. ex., pode ler o texto com precisão, mas não compreende a sequência, as relações, as inferências ou os sentidos mais profundos do que é lido).
  3. Dificuldades para ortografar (ou escrever ortograficamente) (p. ex., pode adicionar, omitir ou substituir vogais e consoantes).
  4. Dificuldades com a expressão escrita (p. ex., comete múltiplos erros de gramática ou pontuação nas frases; emprega organização inadequada de parágrafos; expressão escrita das ideias sem clareza).
  5. Dificuldades para dominar o senso numérico, fatos numéricos ou cálculo (p. ex., entende nú- meros, sua magnitude e relações de forma insatisfatória; conta com os dedos para adicionar números de um dígito em vez de lembrar o fato aritmético, como fazem os colegas; perde-se no meio de cálculos aritméticos e pode trocar as operações).
  6. Dificuldades no raciocínio (p. ex., tem grave dificuldade em aplicar conceitos, fatos ou operações matemáticas para solucionar problemas quantitativos).

B. As habilidades acadêmicas afetadas estão substancial e quantitativamente abaixo do esperado para a idade cronológica do indivíduo, causando interferência significativa no desempenho acadêmico ou profissional ou nas atividades cotidianas, confirmada por meio de medidas de desempenho padronizadas administradas individualmente e por avaliação clínica abrangente. Para indivíduos com 17 anos ou mais, história documentada das dificuldades de aprendizagem com prejuízo pode ser substituída por uma avaliação padronizada.

C. As dificuldades de aprendizagem iniciam-se durante os anos escolares, mas podem não se manifestar completamente até que as exigências pelas habilidades acadêmicas afetadas excedam as capacidades limitadas do indivíduo (p. ex., em testes cronometrados, em leitura ou escrita de textos complexos longos e com prazo curto, em alta sobrecarga de exigências acadêmicas).

D. As dificuldades de aprendizagem não podem ser explicadas por deficiências intelectuais, acuidade visual ou auditiva não corrigida, outros transtornos mentais ou neurológicos, adversidade psicossocial, falta de proficiência na língua de instrução acadêmica ou instrução educacional inadequada.

Nota: Os quatro critérios diagnósticos devem ser preenchidos com base em uma síntese clínica da história do indivíduo (do desenvolvimento, médica, familiar, educacional), em relatórios escolares e em avaliação psicoeducacional.
Nota para codificação: Especificar todos os domínios e sub-habilidades acadêmicos prejudicados. Quando mais de um domínio estiver prejudicado, cada um deve ser codificado individualmente conforme os especificadores a seguir.

Especificar se:

315.00 (F81.0) Com prejuízo na leitura:
Precisão na leitura de palavras
Velocidade ou fluência da leitura
Compreensão da leitura
Nota: Dislexia é um termo alternativo usado em referência a um padrão de dificuldades de aprendizagem caracterizado por problemas no reconhecimento preciso ou fluente de palavras, problemas de decodificação e dificuldades de ortografia. Se o termo dislexia for usado para especificar esse padrão particular de dificuldades, é importante também especificar quaisquer dificuldades adicionais que estejam presentes, tais como dificuldades na compreensão da leitura ou no raciocínio matemático.

315.2 (F81.81) Com prejuízo na expressão escrita:
Precisão na ortografia
Precisão na gramática e na pontuação
Clareza ou organização da expressão escrita

315.1 (F81.2) Com prejuízo na matemática:
Senso numérico
Memorização de fatos aritméticos
Precisão ou fluência de cálculo
Precisão no raciocínio matemático
Nota: Discalculia é um termo alternativo usado em referência a um padrão de dificuldades caracterizado por problemas no processamento de informações numéricas, aprendizagem de fatos aritméticos e realização de cálculos precisos ou fluentes. Se o termo discalculia for usado para especificar esse padrão particular de dificuldades matemáticas, é importante também especificar quaisquer dificuldades adicionais que estejam presentes, tais como dificuldades no raciocínio matemático ou na precisão na leitura de palavras.

Especificar a gravidade atual:

Leve: Alguma dificuldade em aprender habilidades em um ou dois domínios acadêmicos, mas com gravidade suficientemente leve que permita ao indivíduo ser capaz de compensar ou funcionar bem quando lhe são propiciados adaptações ou serviços de apoio adequados, especialmente durante os anos escolares.
Moderada: Dificuldades acentuadas em aprender habilidades em um ou mais domínios acadêmicos, de modo que é improvável que o indivíduo se torne proficiente sem alguns intervalos de ensino intensivo e especializado durante os anos escolares. Algumas adaptações ou serviços de apoio por pelo menos parte do dia na escola, no trabalho ou em casa podem ser necessários para completar as atividades de forma precisa e eficiente.
Grave: Dificuldades graves em aprender habilidades afetando vários domínios acadêmicos, de modo que é improvável que o indivíduo aprenda essas habilidades sem um ensino individualizado e especializado contínuo durante a maior parte dos anos escolares. Mesmo com um conjunto de adaptações ou serviços de apoio adequados em casa, na escola ou no trabalho, o indivíduo pode não ser capaz de completar todas as atividades de forma eficiente.

Procedimentos para Registro

Cada um dos domínios e sub-habilidades acadêmicos prejudicados no transtorno específico da aprendizagem deve ser registrado. Devido às exigências da CID, prejuízos na leitura, na expressão escrita e na matemática, com os prejuízos correspondentes em sub-habilidades, devem ser codificados em separado. Por exemplo, prejuízos em leitura e matemática e em sub-habilidades na velocidade ou fluência de leitura, na compreensão da leitura, no cálculo exato ou fluente e no raciocínio matemático preciso devem ser codificados e registrados como 315.00 (F81.0), transtorno específico da aprendizagem com prejuízo em leitura, com prejuízo na velocidade ou fluência de leitura e prejuízo na compreensão da leitura; como 315.1 (F81.2), transtorno específico da aprendizagem com prejuízo em matemática, com prejuízo no cálculo exato ou fluente e prejuízo no raciocínio matemático preciso.

Características Diagnósticas

O transtorno específico da aprendizagem é um transtorno do neurodesenvolvimento com uma origem biológica que é a base das anormalidades no nível cognitivo as quais são associadas com as manifestações comportamentais. A origem biológica inclui uma interação de fatores genéticos, epigenéticos e ambientais que influenciam a capacidade do cérebro para perceber ou processar informações verbais ou não verbais com eficiência e exatidão.

Uma característica essencial do transtorno específico da aprendizagem são dificuldades persistentes para aprender habilidades acadêmicas fundamentais (Critério A), com início durante os anos de escolarização formal (i.e., o período do desenvolvimento). Habilidades acadêmicas básicas incluem leitura exata e fluente de palavras isoladas, compreensão da leitura, expressão escrita e ortografia, cálculos aritméticos e raciocínio matemático (solução de problemas matemáticos). Diferentemente de andar ou falar, que são marcos adquiridos do desenvolvimento que emergem com a maturação cerebral, as habilidades acadêmicas (p. ex., leitura, ortografia, escrita, matemá- tica) precisam ser ensinadas e aprendidas de forma explícita. Transtornos específicos da aprendizagem perturbam o padrão normal de aprendizagem de habilidades acadêmicas; não constituem, simplesmente, uma consequência de falta de oportunidade de aprendizagem ou educação escolar inadequada. Dificuldades para dominar essas habilidades acadêmicas básicas podem também ser impedimento para aprendizagem de outras matérias acadêmicas (p. ex., história, ciências, estudos sociais), mas esses problemas são atribuíveis a dificuldades de aprendizagem de habilidades acadêmicas subjacentes. Dificuldade de aprender a correlacionar letras a sons do próprio idioma – a ler palavras impressas (frequentemente chamada de dislexia) – é uma das manifestações mais comuns do transtorno específico da aprendizagem. As dificuldades de aprendizagem manifestam-se como uma gama de comportamentos ou sintomas descritivos e observáveis (conforme listado nos Critérios A1-A6). Esses sintomas clínicos podem ser observados, investigados a fundo por entrevista clínica ou confirmados a partir de relatórios escolares, escalas classificatórias ou descrições em avaliações educacionais ou psicológicas prévias. As dificuldades de aprendizagem são persistentes e não transitórias. Em crianças e adolescentes, define-se persistência como um limitado progresso na aprendizagem (i.e., ausência de evidências de que o indivíduo está alcançando o mesmo nível dos colegas) durante pelo menos seis meses apesar de ter sido proporcionada ajuda adicional em casa ou na escola. Por exemplo, dificuldades em aprender a ler palavras isoladas que não se resolvem completa ou rapidamente com a provisão de instrução em habilidades fonológicas ou estratégias de identificação de palavras podem indicar um transtorno específico da aprendizagem. Evidências de dificuldades persistentes de aprendizagem podem ser detectadas em relatórios escolares cumulativos, portfólios de trabalhos da criança avaliados, medidas baseadas no currículo ou entrevista clínica. Nos adultos, dificuldade persistente refere-se a dificuldades contínuas no letramento ou numeralização que se manifestam na infância ou na adolescência, conforme indicado por evidências cumulativas de relatórios escolares, portfólios de trabalhos avaliados ou avaliações prévias.

Uma segunda característica-chave é a de que o desempenho do indivíduo nas habilidades acadêmicas afetadas está bem abaixo da média para a idade (Critério B). Um forte indicador clí- nico de dificuldades para aprender habilidades acadêmicas é baixo desempenho acadêmico para a idade ou desempenho mediano mantido apenas por níveis extraordinariamente elevados de esforço ou apoio. Em crianças, habilidades escolares de baixo nível causam interferência significativa no desempenho escolar (conforme indicado por relatórios escolares e notas e avaliações de professores). Outro indicador clínico, particularmente em adultos, é a evitação de atividades que exigem habilidades acadêmicas. Também na vida adulta, baixas habilidades acadêmicas interferem no desempenho profissional ou nas atividades cotidianas que exijam essas habilidades (conforme indicado por autorrelato ou relato de outros). Esse critério, todavia, também requer evidências psicométricas resultantes de teste de desempenho acadêmico administrado individualmente, psicometricamente apropriado e culturalmente adequado, padronizado ou referenciado a critérios. As habilidades acadêmicas distribuem-se ao longo de um continnum; assim, não há ponto de corte natural que possa ser usado para diferenciar indivíduos com ou sem transtorno específico da aprendizagem. Portanto, qualquer limiar usado para especificar o que constitui desempenho acadêmico significativamente baixo (p. ex., habilidades acadêmicas muito abaixo do esperado para a idade) é, em grande parte, arbitrário. Baixos escores acadêmicos em um ou mais de um teste padronizado ou em subtestes em um domínio acadêmico (i.e., no mínimo 1,5 desvio-padrão [DP] abaixo da média populacional para a idade, o que se traduz por um escore-padrão de 78 ou menos, abaixo do percentil 7) são necessários para maior certeza diagnóstica. Escores exatos, entretanto, irão variar de acordo com os testes padronizados específicos empregados. Com base em juízos clínicos, pode ser usado um limiar mais tolerante (p. ex., 1,0-2,5 DP abaixo da média populacional para a idade) quando as dificuldades de aprendizagem são apoiadas por evidências convergentes de avaliação clínica, história acadêmica, relatórios escolares ou escores de testes. Além do mais, considerando que testes padronizados não estão disponíveis em todos os idiomas, o diagnóstico pode então ser baseado, em parte, no julgamento clínico dos escores de testes disponíveis.

Uma terceira característica central é a de que as dificuldades de aprendizagem estejam prontamente aparentes nos primeiros anos escolares, na maior parte dos indivíduos (Critério C). Entretanto, em outros, as dificuldades de aprendizagem podem não se manifestar plenamente até os anos escolares mais tardios, período em que as demandas de aprendizagem aumentam e excedem as capacidades individuais limitadas.

Outra característica diagnóstica fundamental é a de que as dificuldades de aprendizagem sejam consideradas “específicas” por quatro razões. Primeiro, elas não são atribuíveis a deficiências intelectuais (deficiência intelectual [transtorno do desenvolvimento intelectual]); a atraso global do desenvolvimento; a deficiências auditivas ou visuais; ou a problemas neurológicos ou motores (Critério D). O transtorno específico da aprendizagem afeta a aprendizagem em indiví- duos que, de outro modo, demonstram níveis normais de funcionamento intelectual (geralmente estimado por escore de QI superior a cerca de 70 [±5 pontos de margem de erro de medida]). A expressão “insucesso acadêmico inesperado” é frequentemente citada como a característica definidora do transtorno específico da aprendizagem, no sentido de que as incapacidades de aprendizagem específicas não são parte de uma dificuldade de aprendizagem mais genérica, como a que ocorre na deficiência intelectual ou no atraso global do desenvolvimento. O transtorno específico da aprendizagem pode, ainda, ocorrer em indivíduos identificados como intelectualmente “talentosos”. Eles podem conseguir manter um funcionamento acadêmico aparentemente adequado mediante o uso de estratégias compensatórias, esforço extraordinariamente alto ou apoio, até que as exigências de aprendizagem ou os procedimentos avaliativos (p. ex., testes cronometrados) imponham barreiras à sua aprendizagem ou à realização de tarefas exigidas. Segundo, a dificuldade de aprendizagem não pode ser atribuída a fatores externos mais gerais, como desvantagem econômica ou ambiental, absenteísmo crônico ou falta de educação, conforme geralmente oferecida no contexto da comunidade do indivíduo. Terceiro, a dificuldade para aprender não pode ser atribuída a algum transtorno neurológico (p. ex., acidente vascular cerebral pediátrico) ou motor ou a deficiência visual ou auditiva, os quais costumam ser associados a problemas de aprendizagem de habilidades acadêmicas, mas que são distinguíveis pela presença de sinais neurológicos. Por fim, a dificuldade de aprendizagem pode se limitar a uma habilidade ou domínio acadêmico (p. ex., leitura de palavras isoladas, evocação ou cálculos numéricos).

Uma avaliação abrangente é necessária. Um transtorno específico da aprendizagem só pode ser diagnosticado após o início da educação formal, mas, a partir daí, pode ser diagnosticado em qualquer momento em crianças, adolescentes e adultos, desde que haja evidência de início durante os anos de escolarização formal (i.e., o período do desenvolvimento). Nenhuma fonte única de dados é suficiente para o diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem. Ao contrário, o diagnóstico é clínico e baseia-se na síntese da história médica, de desenvolvimento, educacional e familiar do indivíduo; na história da dificuldade de aprendizagem, incluindo sua manifestação atual e prévia; no impacto da dificuldade no funcionamento acadêmico, profissional ou social; em relatórios escolares prévios ou atuais; em portfólios de trabalhos que demandem habilidades acadêmicas; em avaliações de base curricular; e em escores prévios e atuais resultantes de testes individuais padronizados de desempenho acadêmico. Diante da suspeita de um problema intelectual, sensorial, neurológico ou motor, a avaliação clínica de transtorno específico da aprendizagem deve, ainda, incluir métodos apropriados para esses distúrbios. Assim, uma investigação abrangente envolverá profissionais especialistas em transtorno específico da aprendizagem e em avaliação psicológica/cognitiva. Uma vez que o transtorno costuma persistir na vida adulta, raramente há necessidade de reavaliação, a não ser que indicada por mudanças marcantes nas dificuldades de aprendizagem (melhora ou piora) ou por solicitação para fins específicos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico

O transtorno específico da aprendizagem é precedido, frequentemente, embora não de forma invariável, nos anos pré-escolares, por atrasos na atenção, na linguagem ou nas habilidades motoras, capazes de persistir e de ser comórbidos com transtorno específico da aprendizagem. Um perfil irregular de capacidades é comum, como capacidades acima da média para desenhar, para design e outras capacidades visuoespaciais, mas leitura lenta, trabalhosa e imprecisa, bem como dificuldades na compreensão da leitura e na expressão escrita. Indivíduos com transtorno especí- fico da aprendizagem tipicamente (mas não invariavelmente) exibem baixo desempenho em testes psicológicos de processamento cognitivo. Ainda não está claro, entretanto, se essas anormalidades cognitivas são causa, correlatos ou consequência das dificuldades de aprendizagem. Além disso, embora déficits cognitivos associados com dificuldades em aprender a ler palavras estejam bem documentados, aqueles associados com outras manifestações do transtorno específico da aprendizagem (p. ex., compreensão da leitura, cálculo aritmético, expressão escrita) são pouco conhecidos ou especificados. Ademais, indivíduos com sintomas comportamentais ou escores de testes comparáveis apresentam uma variedade de déficits cognitivos, e muitos desses déficits de processamento também são encontrados em outros transtornos do neurodesenvolvimento (p. ex.,TDAH, transtorno do espectro autista, transtornos da comunicação, transtorno do desenvolvimento da coordenação). Logo, não há necessidade de investigar déficits de processamento cognitivo para uma avaliação diagnóstica. O transtorno específico da aprendizagem está associado a risco aumentado de ideação e tentativas de suicídio em crianças, adolescentes e adultos.

Não existem marcadores biológicos conhecidos de transtorno específico da aprendizagem. Como grupo, indivíduos com o transtorno apresentam alterações circunscritas no processamento cognitivo e na estrutura e no funcionamento cerebral. Diferenças genéticas também são evidentes em nível de grupo. Entretanto, testes cognitivos, neuroimagem ou testes genéticos não são úteis para o diagnóstico no momento atual.

Prevalência

A prevalência do transtorno específico da aprendizagem nos domínios acadêmicos da leitura, escrita e matemática é de 5 a 15% entre crianças em idade escolar, em diferentes idiomas e culturas. Nos adultos, a prevalência é desconhecida, mas parece ser de aproximadamente 4%.

Desenvolvimento e Curso

Início, reconhecimento e diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem costumam ocorrer durante os anos do ensino fundamental, quando as crianças precisam aprender a ler, ortografar, escrever e calcular. Precursores, porém, como atrasos ou déficits linguísticos, dificuldades para rimar e contar ou dificuldades com habilidades motoras finas necessárias para a escrita costumam ocorrer na primeira infância, antes do início da escolarização formal. As manifesta- ções podem ser comportamentais (p. ex., relutância em envolver-se na aprendizagem; comportamento de oposição). O transtorno específico da aprendizagem permanece ao longo da vida, mas seu curso e expressão clínica variam, em parte, dependendo das interações entre as exigências ambientais, a variedade e a gravidade das dificuldades individuais de aprendizagem, as capacidades individuais de aprendizagem, comorbidades e sistemas de apoio e intervenção disponí- veis. Ainda assim, na vida diária, problemas na fluência e compreensão da leitura, na soletração, na expressão escrita e na habilidade com números costumam persistir na vida adulta.

Mudanças na manifestação dos sintomas ocorrem com a idade, de modo que um indivíduo pode ter um conjunto persistente ou mutável de dificuldades de aprendizagem em seu ciclo de vida.

Exemplos de sintomas que podem ser observados entre crianças pré-escolares incluem falta de interesse em jogos com sons da língua (p. ex., repetição, rimas), e elas podem ter problemas para aprender rimas infantis. Crianças pré-escolares com transtorno específico da aprendizagem podem, com frequência, falar como bebês, pronunciar mal as palavras e ter dificuldade para lembrar os nomes de letras, números ou dias da semana. Elas podem não conseguir reconhecer as letras do pró- prio nome e ter problemas para aprender a contar. Crianças de jardim da infância com transtorno específico da aprendizagem podem não ser capazes de reconhecer e escrever as letras; podem não ser capazes de escrever o próprio nome; ou podem usar combinações inventadas de letras. Podem ter problemas para quebrar palavras faladas em sílabas (p. ex., quarto, separado em quar-to), bem como problemas no reconhecimento de palavras que rimam (p. ex., gato, rato, pato). Crianças que vão ao jardim de infância podem, ainda, ter problemas para conectar letras e seus sons (p. ex., a letra “b” tem o som /b/) e podem também não ser capazes de reconhecer fonemas (p. ex., não sabem qual, em um conjunto de palavras [p. ex., bolo, vaca, carro], inicia com o mesmo som de “casa”).

O transtorno específico da aprendizagem em crianças do ensino fundamental costuma se manifestar como uma dificuldade acentuada para aprender a correspondência entre letra e som (especialmente em crianças cujo idioma é o inglês), decodificar as palavras com fluência, ortografar ou compreender fatos matemáticos; a leitura em voz alta é lenta, imprecisa e trabalhosa, e algumas crianças sofrem para compreender a magnitude que um número falado ou escrito representa. As crianças, nos primeiros anos escolares (1o a 3o ano), podem continuar a ter problemas no reconhecimento e na manipulação de fonemas, ser incapazes de ler palavras comuns monossilábicas (tais como cão ou pó) e ser incapazes de reconhecer palavras comuns soletradas irregularmente (p. ex., ficho por fixo). Elas podem cometer erros de leitura, indicativos de problemas para conectar sons e letras (p. ex., jato por gato em inglês), além de apresentar dificuldades para colocar números e letras em sequência. Crianças do 1o ao 3o ano podem também ter dificuldade para lembrar fatos numéricos ou operações matemáticas de adição, subtração e assim por diante, podendo ter queixas de que a leitura ou a aritmética é difícil e evitando fazê-las. Crianças com transtorno específico da aprendizagem nas séries intermediárias (4o a 6o ano) podem pronunciar mal ou pular partes de palavras longas e multissilábicas (p. ex., convido em vez de convidado, aminal em vez de animal) e confundir palavras com sons semelhantes (p. ex., comestível e combustível, inferno e inverno). Podem apresentar problemas para recordar datas, nomes e números de telefone e ainda dificuldades para completar no tempo temas de casa ou testes. Crianças nas séries intermediárias podem, ainda, ter problemas de compreensão, com ou sem leitura lenta, trabalhosa e imprecisa, e podem ter problemas para ler pequenas palavras funcionais (p. ex., que, o/a, em). Podem ter uma ortografia muito ruim, bem como apresentar trabalhos escritos insatisfatórios.Podem acertar a primeira parte de uma palavra e depois tentar adivinhar o restante (p. ex., leitura de clover como clock, no inglês), podendo manifestar medo ou recusa a ler em voz alta.

Em contraste, os adolescentes podem ter dominado a decodificação de palavras, mas a leitura permanece lenta e trabalhosa, com tendência a problemas acentuados na compreensão da leitura e na expressão escrita (inclusive problemas ortográficos), bem como domínio insatisfatório de fatos matemáticos ou solução de problemas matemáticos. Na adolescência e na vida adulta, indivíduos com transtorno específico da aprendizagem podem continuar a cometer vários erros de ortografia, ler palavras isoladas e textos lentamente e com muito esforço, com problemas na pronúncia de palavras multissilábicas. Com frequência, podem precisar reler o material para compreender ou captar o ponto principal e ter problemas para fazer inferências a partir de textos escritos. Adolescentes e adultos podem evitar atividades que exijam leitura ou matemática (ler por prazer, ler instruções). Adultos com o transtorno têm problemas contínuos de ortografia, leitura lenta e trabalhosa ou problemas para fazer inferências importantes a partir de informações numéricas, em documentos escritos relacionados à vida profissional. Podem evitar atividades de lazer e profissionais que demandem leitura ou escrita ou usar estratégias alternativas para ter acesso a material impresso (p. ex., software texto-pronúncia/pronúncia-texto, áudio livros, mídia audiovisual).

Uma expressão clínica alternativa inclui dificuldades de aprendizagem circunscritas que persistam ao longo vida, como incapacidade de dominar o sentido básico dos números (p. ex., saber qual de um par de números ou pontos representa a magnitude maior) ou não ter proficiência na identificação e na ortografia das palavras. Evitação ou relutância em se envolver em atividades que exijam habilidades acadêmicas é comum em crianças, adolescentes e adultos. Episódios de ansiedade grave ou transtornos de ansiedade, incluindo queixas somáticas ou ataques de pânico, são comuns ao longo vida e acompanham as expressões circunscrita e ampla das dificuldades de aprendizagem.

Fatores de Risco e Prognóstico

Ambientais. Prematuridade e muito baixo peso ao nascer aumentam o risco de transtorno específico da aprendizagem, da mesma forma que exposição pré-natal a nicotina.
Genéticos e fisiológicos. O transtorno específico da aprendizagem parece agregrar-se em famílias, particularmente quando afeta a leitura, a matemática e a ortografia. O risco relativo de transtorno específico da aprendizagem da leitura ou da matemática é substancialmente maior (p. ex., 4 a 8 vezes e 5 a 10 vezes mais alto, respectivamente) em parentes de primeiro grau de indiví- duos com essas dificuldades de aprendizagem na comparação com aqueles que não as apresentam. História familiar de dificuldades de leitura (dislexia) e de alfabetização prediz problemas de alfabetização ou transtorno específico da aprendizagem na prole, indicando o papel combinado de fatores genéticos e ambientais.
Existe elevada herdabilidade na capacidade e na incapacidade de leitura, nos idiomas alfabéticos e não alfabéticos, incluindo alta herdabilidade para a maioria das manifestações de capacidades e incapacidades de aprendizagem (p. ex., estimativas de herdabilidade maiores do que 0,6). A covariação entre as várias manifestações de dificuldades de aprendizagem é alta, sugerindo que genes relacionados a uma apresentação estão altamente correlacionados com genes relacionados a outra manifestação.
Modificadores do curso. Problemas acentuados com comportamento de desatenção nos anos pré-escolares predizem dificuldades posteriores em leitura e matemática (mas não necessariamente transtorno específico da aprendizagem) e não resposta a intervenções acadêmicas efetivas. Atraso ou transtornos na fala ou na linguagem, ou processamento cognitivo prejudicado (p. ex., consciência fonológica, memória de trabalho capacidade de nomear rapidamente em série) nos anos pré-escolares predizem transtorno específico da aprendizagem posterior em leitura e expressão escrita. A comorbidade desses problemas com TDAH é preditora de pior evolução da saúde mental quando comparada àquela associada a um transtorno específico da aprendizagem sem TDAH. Instrução sistemática, intensiva e individualizada, utilizando intervenções baseadas em evidências, pode melhorar ou diminuir as dificuldades de aprendizagem em alguns indivíduos ou promover o uso de estratégias compensatórias em outros, mitigando, dessa forma, evoluções de outro modo negativas.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura

Transtorno específico da aprendizagem ocorre em diferentes idiomas, culturas, raças e condições socioeconômicas; pode, porém, variar em sua manifestação, de acordo com a natureza dos sistemas de símbolos escritos e falados e práticas culturais e educacionais. Por exemplo, as exigências  para processamento cognitivo da leitura e do trabalho com números variam muito nas várias ortografias. No inglês, o sintoma clínico observável que constitui um marco de dificuldades de aprendizagem para ler é a leitura lenta e imprecisa de palavras isoladas; em outros idiomas alfabéticos, com uma combinação mais direta entre sons e letras (p. ex., espanhol, alemão), e em idiomas não alfabéticos (p. ex., chinês, japonês), o aspecto marcante é uma leitura lenta, mas exata. Nos indivíduos que aprendem o idioma inglês, a avaliação deve incluir uma análise sobre se a fonte das dificuldades de leitura é uma proficiência limitada no idioma ou um transtorno específico da aprendizagem. Fatores de risco para transtorno específico da aprendizagem entre aqueles que aprendem inglês incluem história familiar de transtorno específico da aprendizagem ou atraso de linguagem na língua nativa, bem como dificuldades de aprendizagem em inglês e incapacidade de acompanhar os colegas. Diante da suspeita de diferenças culturais ou de idioma (p. ex., caso de pessoa que está aprendendo inglês), a avaliação precisa levar em conta a proficiência linguística do indivíduo no próprio idioma, bem como na segunda língua (neste caso, o inglês). Além disso, a avaliação deve considerar o contexto linguístico e cultural em que a pessoa vive, além da história educacional e de aprendizagem na cultura e idioma originais.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero

O transtorno específico da aprendizagem é mais comum no sexo masculino do que no feminino (as proporções variam de cerca de 2:1 a 3:1), não podendo ser atribuído a fatores como viés de recrutamento, variação em definições ou medidas, linguagem, raça ou nível socioeconômico.

Consequências Funcionais do Transtorno Específico da Aprendizagem

O transtorno específico da aprendizagem pode ter consequências funcionais negativas ao longo da vida, incluindo baixo desempenho acadêmico, taxas mais altas de evasão do ensino médio, menores taxas de educação superior, níveis altos de sofrimento psicológico e pior saúde mental geral, taxas mais elevadas de desemprego e subemprego e renda menor. Evasão escolar e sintomas depressivos comórbidos aumentam o risco de piores desfechos de saúde mental, incluindo suicidalidade, enquanto altos níveis de apoio social ou emocional predizem melhores desfechos de saúde mental.

Diagnóstico Diferencial

Variações normais no desempenho acadêmico. O transtorno específico da aprendizagem distingue-se de variações normais no desempenho acadêmico devido a fatores externos (p. ex., falta de oportunidade educacional, educação escolar consistentemente insatisfatória, aprendizagem em uma segunda língua), uma vez que as dificuldades de aprendizagem persistem na presença de oportunidade educacional adequada, exposição à mesma educação escolar que o grupo de colegas e competência no idioma da educação escolar, mesmo quando este é diferente da língua materna do indivíduo.
Deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual). O transtorno especí- fico da aprendizagem difere de dificuldades gerais de aprendizagem associadas a deficiência intelectual, porque as dificuldades para aprender ocorrem na presença de níveis normais de funcionamento intelectual (i.e., escore do QI de, no mínimo, 70± 5). Diante da presença de deficiência intelectual, o transtorno específico da aprendizagem pode ser diagnosticado somente se as dificuldades para aprender excedem as comumente associadas à deficiência intelectual.
Dificuldades de aprendizagem devidas a problemas neurológicos ou sensoriais. O transtorno específico da aprendizagem distingue-se de dificuldades de aprendizagem devidas a problemas neurológicos ou sensoriais (p. ex., acidente vascular cerebral pediátrico, lesão cerebral traumática, deficiência auditiva, deficiência visual), porque, nesses casos, há achados anormais no exame neurológico.
Transtornos neurocognitivos. O transtorno específico da aprendizagem distingue-se de problemas de aprendizagem associados com transtornos cognitivos neurodegenerativos, porque, no transtorno específico da aprendizagem, a expressão clínica de dificuldades específicas de aprendizagem ocorre durante o período do desenvolvimento, e as dificuldades não se manifestam como um declínio acentuado a partir de um estado anterior.
Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. O transtorno específico da aprendizagem distingue-se do desempenho acadêmico insatisfatório associado ao TDAH, porque nessa condi- ção os problemas podem não necessariamente refletir dificuldades específicas na aprendizagem de habilidades, podendo, sim, ser reflexo de dificuldades no desempenho daquelas habilidades. Todavia, a comorbidade de transtorno específico da aprendizagem e TDAH é mais frequente do que o esperado apenas. Se critérios para ambos os transtornos forem preenchidos, os dois diagnósticos podem ser dados.
Transtornos psicóticos. O transtorno específico da aprendizagem distingue-se das dificuldades acadêmicas e de processamento cognitivo associadas com esquizofrenia ou psicose, porque, no caso desses transtornos, ocorre um declínio (frequentemente rápido) nesses domínios funcionais.

Comorbidade

O transtorno específico da aprendizagem costuma ser comórbido com transtornos do neurodesenvolvimento (p. ex., TDAH, transtornos da comunicação, transtorno do desenvolvimento da coordenação, transtorno do espectro autista) ou com outros transtornos mentais (p. ex., transtornos de ansiedade, transtornos depressivo e bipolar). Essas comorbidades não necessariamente excluem o diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem, mas podem dificultar mais os testes e o diagnóstico diferencial, uma vez que cada um desses transtornos comórbidos interfere, de forma independente, na execução de atividades da vida diária, inclusive na aprendizagem. Assim, o julgamento clínico é necessário para atribuir tal prejuízo a dificuldades de aprendizagem. Havendo indicação de que outro diagnóstico possa ser responsável pelas dificuldades na aprendizagem de habilidades acadêmicas fundamentais, descritas no Critério A, não deve ser feito um diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem.

(Fonte: DSM-5)


O texto acima possui caráter exclusivamente informativo. Jamais empreenda qualquer tipo de tratamento ou se automedique sem a orientação de um especialista.